Webdocumentário como gênero do Jornalismo Digital

Ponta Grossa, 26 de fevereiro de 2010

Olá, crianças!

Apesar da informalidade que a liguagem do blog pede, vou abrir espaço para um texto mais científico. Trata-se de um dos tópicos do projeto do meu TCC “Batidas hipermidiáticas: proposta de webdocumentário jornalístico sobre o processo criativo do movimento hip hop de Ponta Grossa”.

Esse título enorme já não descreve tão bem os objetivos do trabalho, uma vez que decidi (junto com a minha orientadora, Maria Lúcia Becker, e com a banca de qualificação, Rafael Schoenherr e Felipe Harmata) mudar um pouco o foco do trabalho monográfico e do produto, mas isso eu explico outra hora.

Ao colocar o tópico “Webdocumentário como gênero do Jornalismo Digital”, tenho por objetivo demonstrar que caminhos estou percorrendo no trabalho de pesquisa sobre esse formato. É ainda algo a ser ampliado, claro. Aproveitem!

Webdocumentário como gênero do Jornalismo Digital

Emanuelle Alves Adacheski, com orientação de Maria Lúcia Becker

A sistematização dos gêneros do jornalismo brasileiro feita por Marques de Melo (2003), baseada na função, no estilo e na dimensão cultural em que se insere o Jornalismo, por ser relativa ao impresso, não contribui muito para a definição do webdocumentário como novo gênero do Jornalismo Digital. Lia Seixas (2003) apresenta outros critérios, no sentido de que a especificidade da modalidade exige critérios próprios (desvinculados do impresso) para a definição de seus gêneros.

A primeira pergunta que Díaz Noci (2005) faz é se ocorre uma alteração nos gêneros na Web. De fato, determinadas características da Web, como a permanência dos conteúdos e o armazenamento ilimitado, sugerem modificações na hora de produzir e publicar informações na Web. Segundo o autor, o jornalismo interpretativo vê-se beneficiado com o ambiente da rede, especialmente com a hipertextualidade. Ele cita Tascón, o qual conclui que as mudanças tecnológicas provocam o surgimento de novos gêneros.

Barbosa (2004), apoiada em Manovich, coloca que as bases de dados (as quais reivindica como caracterizadoras das gerações mais recentes do Jornalismo Digital) são espaço de inovação e desenvolvimento de novos gêneros, híbridos entre gêneros e incremento dos gêneros tradicionais. Citando Maingueneau, Barbosa destaca que o desenvolvimento de novos gêneros tem relação com condições sócio-históricas favoráveis, de tal modo que uma sociedade pode ser caracterizada pelos gêneros de discurso que ela torna possível. Um dos novos gêneros sugeridos é o infográfico interativo.

Voltando a Seixas (2003), a autora vai apresentando pistas destes critérios que pretende ser importantes na definição dos gêneros do Jornalismo Digital, como “os tipos de conexões e hierarquia hipertextual que opere” (p. 94) e “tempo de atualização próprio” (p. 95). Finalmente, a autora sugere “analisar as dimensões do interdiscurso segundo as características da mídia digital. Os critérios de análise seriam, a princípio: interação, autoria, contrato social, campo de recepção, linguagens, tempo e mídia” (p. 95).

Por essa perspectiva, pode-se classificar o webdocumentário como gênero próprio, pois, apesar de compartilhar alguns modos como se relaciona com cada critério com outros produtos, é absolutamente particular no conjunto. Veja-se como o webdocumentário se relaciona com cada critério.

Quanto à interação, embora abra possibilidades de diversos níveis, baseia-se numa interatividade limitada por um roteiro. A autoria não é diluída, pelo contrário, é fundamental, pois a coerência e a construção do roteiro estão calcadas no ponto de vista do autor.

Quanto ao contrato social, podem-se retomar as ideias de Nichols (2005) a respeito do documentário, quando diz que o mesmo encoraja uma crença de autenticidade (uma vez que trabalha com elementos indexadores da realidade que representam) ao mesmo tempo em que assume um ponto de vista, uma argumentação, busca convencer da validade de sua “opinião”, ou seja, o público reconhece o posicionamento.

Já em relação ao campo de recepção, o webdocumentário busca intensamente a imersão do usuário, que ele “se transfira” para a ambientação do produto, ou melhor, para a interface de interação, como explica Penafria (1999), a qual é pensada sob critérios de coerência entre conteúdo (ponto de vista) e forma, no que se pode chamar, atualizando Nichols (2005), de voz do webdocumentário. No que toca à linguagem, o webdocumentário reivindica e se caracteriza por uma linguagem multimídia (conformando-se em hipermídia cujo suporte é a Web). Afinal, webdocumentário não pode ser feito só de texto (no sentido de texto intencional, autoral, escrito ou falado), pois essa é a instância do ponto de vista e da argumentação do autor no documentário tradicional, o qual deve se construir sobre registros in loco, o que o texto e a descrição são incapazes de fazer integralmente.

Referente ao penúltimo critério, o tempo, o webdocumentário coloca-se como “matéria fria”, ou seja, não é factual. De fato, nesse sentido, compreende-se que o webdocumentário se encaixa no espaço de publicação online dos especiais, conforme descrito por Mielniczuk (2003, p. 52): “Os especiais, embora possam ser também matérias de destaque na edição, na maioria das vezes, refere-se a material informativo mais extenso, elaborado com mais tempo e que ocupam seções específicas do webjornal”. São dois, portanto, os tipos de especiais: matérias de destaque (sem tratamento distinto quanto ao arquivamento) e especiais (disponibilização permanente e cumulativa, “certo caráter enciclopédico”; utilizam com mais freqüência memória, hipertextualidade e multimidialidade). O webdocumentário pode ser classificado na segunda definição.

Finalmente, a mídia em que se insere o webdocumentário é obrigatoriamente a Web, pois a possível relação que o produto tiver com outros conteúdos é outro elemento básico do gênero e que o diferencia do “documentário digital” e da hipermídia em CD-ROM, por exemplo.

Bibliografia

BARBOSA, Susana. Identificando remediações e rupturas no uso de bancos de dados no jornalismo digital, 2004.

DIAZ NOCI, Javier. La escritura periodística : apuntes. 2005. Disponível em:http://www.facom.ufba.br/jol/atividades_cursos_diaznoci.htm. Acesso em: 25 jan. 2007.

MARQUES DE MELO, José. Jornalismo Opinativo: gêneros opinativos no jornalismo brasileiro. 3.ed. rev. e ampl. – Campos do Jordão: Mantiqueira, 2003.

MIELNICZUK, Luciana. Sistematizando alguns conhecimentos sobre jornalismo na web. In: MACHADO, Elias e PALACIOS, Marcos. Modelos de jornalismo digital (org.). Salvador: Edições GJOL; Calandra, 2003.

NICHOLS, Bill. Introdução ao documentário. Papirus Editora, 2005.

PENAFRIA, Manuela. O filme documentário: história, identidade, tecnologia. Lisboa: Cosmos, 1999.

SEIXAS, Lia. Gêneros jornalísticos digitais: critérios para definir os produtos do webjornalismo. In: MACHADO, Elias e PALACIOS, Marcos. Modelos de jornalismo digital (org.). Salvador: Edições GJOL; Calandra, 2003.

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